Estava eu
tão descansado naquela linda manhã, respirando perfumes de maio, quando fui
interrompido por estridente e telefónico som inimigo:
“Alô… daqui
fala Pinto Barradas. O senhor chanceler vai ter que ouvir em auto de
interrogatório, a pedido da Justiça portuguesa, um cidadão que fez das boas…
- Sim,
claro, senhor cônsul-geral, vou chama-lo à sala de espera?
-
Sim…Não…Espere ai, eu próprio o levo ao seu gabinete”.
E apareceram-me
em curto prazo o corpanzil do cônsul empurrando o frágil “arguido”.
- “Tome lá,
– lançando a carta precatória – e extraia dele tudo o que for necessário para
boa elucidação da autoridade.”. E saiu repentinamente para se dedicar, decerto,
a actividades mais importantes.
-
“Senhor…?”
- “Jaquim
Manoel”, responde com largo sorriso o faltoso.
Li
rapidamente e em silêncio o termo de culpa, sem de vez em quando ter de
reprimir um esboço de riso. A situação era cómica e eu, transformado em
magistrado, tinha de manter um oficial respeito.
Li ao
arguido o relatório elaborado pelo cabo-comandante da GNR do Seixal…
O Jaquim
Manoel era o protótipo do tuga bem disposto, risonho mas, que quando a
coisa saia para o torto, não deixava crédito por mãos alheias…Pequenino, moreno
de cabelo preto, bigodaça farfalhuda, ia sorrindo à medida que lhe lia o auto.
E o auto
redigido pelo cabo tinha uma certa graça.
- “Eram 4
horas da manhã quando vi um carro de matrícula estrangeira aproximar-se do
ponto de controlo a alguma velocidade. Instado a parar, o condutor parou. Como
lhe fiz a observação de que me parecia estar ébrio, rindo me respondeu: “Pois,
tive numa festa e querias que bebesse agua seu labrego”.
Ignorando o
insulto, pedi-lhe que soprasse no detector de alcoolemia, ao que me respondeu:
“Só sopro depois de tu soprares seu manguela”…
Pedi-lhe,
então que me mostrasse os documentos de identificação e da viatura, ao que me
respondeu: “Eu mostro-te é o caralho!”.
“Diga-me
então o seu nome” ao que respondeu: “Olha, em português é Jaquim Manoel e em
francês é tens os cornos virados para tras”…
De
paciência esgotada apontei-lhe a arma de serviço; mas o individuo saindo
bruscamente do veiculo, apoderou-se da mesma, deu-me dois pares de estalos,
rasgou-me a farda e pirou-se. Nunca mais o vi. Viria a saber mais tarde que ja deixara o territorio nacional".
Logicamente,
o assunto não sendo meu, esperei a sua saída para desatar presas e largas gargalhadas.
Bem,
confesso que apenas pedi ao Jaquim Manel que
assinasse o depoimento…
29-04-2015
JoanMira