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Texto - Saudosa amizade

Não sei porquê mas, constantemente velhos e saudosos amigos me vêm à memoria: é caso do Manuel da Silva que comigo colaborava, com a sua voz extraordinária em programas radiofonicos, na altura ainda proibidos…


Estavamos em 1983, infringíamos a lei sem medo nem agravo, e depois da hora “de antena”, bebíamos um copo, dois, três… Perdão, não me lembro bem…

O Manuel tinha uma rubrica sui-generis: era dele a pagina do desporto que os ouvintes ansiavam ouvir, esperando que até ao fim do programa ele chegasse…

Tinha uma voz de locutor dos anos sessenta muito parecida com a do Nuno Braz. (os leitores mais idosos sabem do que estou a falar).

Foi um dos esteios principais do nosso “programa”… E era um daqueles Amigos “veros” que creio já não existem.

Depois outros vieram com boa vontade mas jamais o igualaram.

Outra personalidade com quem convivi, por horas, foi a Amália Rodrigues.

Era amiga do Fernando Pereira; éramos amigos. 

Eu, com ele acompanhado, possuía uma enciclopédia do fado. Ele tinha conhecido os maiores fadistas de raça e de renome: Alfredo Marceneiro, Carlos Ramos, o grande Linhares Barbosa e, o seu grande amor Amália Rodrigues.

Com cerca de vinte anos mais que eu, o Pereira era uma fonte inesgotável dos tempos d’Alfama, do tempo passado; possuía milhentas historias dos fadistas que me contava, à volta de um copo, mas que nunca quis revelar por escrito ou narrar à frente de um microfone!

Não sei porquê, um dia descuidou-se e disse-me que tinha sido companheiro da Amália.

As duvidas foram desfeitas no dia 9 de março de 1986, num espectáculo em Tarbes (França) – em que a Amália teve varias falhas (a memoria não ajudava). Antes de terminar o espectáculo, Fernando aproximou-se, entusiasta, de Amália e deu-lhe um beijo como nos filmes a preto e branco.

Quando Amália e Fernando se beijaram naquele dia fiquei a saber que não me tinha mentido! Aquele abraço, aquela emoção partilhada…

Nesse mesmo dia, ao fim do espectáculo, Amália muito cansada, teve uma intervenção fantástica; ao cônsul sovina, pretendendo brindar com apenas duas garrafas de champanhe para cerca de vinte pessoas de taças vazias lançou: “Eu gostava de brindar, senhor cônsul-geral - Pausa, olhando para as taças – mas parece que não há mais saude”…

Por ultimo não posso esquecer o meu grande Amigo Pedro Teixeira, recentemente falecido... Uma pessoa extraordinária que, mesmo eu, pessoa em principio retraída, não hesitei logo nos meus primeiros dias do Rio, em lhe propor que nos tratássemos por "tu". No momento, impressionava-me pela cultura detida, pelo sotaque Português nunca perdido...

Não havia hierarquia, não havia senão as feijoadas que comíamos à sexta-feira onde o "Pierre" era "impressionante”...

Grande Amigo, todos os dias da minha vida choro por ti.

29-05-2016

JoanMira